Por Kakay
“Aquele que não conhece a verdade é simplesmente um ignorante, mas aquele que a conhece e diz que é mentira, este é um criminoso” – Bertolt Brecht
A pergunta que povoou o imaginário brasileiro nos últimos meses – “Onde está o Queiroz?” –, talvez possa agora, ao ser respondida, servir para esclarecer outra indagação que nos aflige: “Quem matou Marielle?”.
Neste Brasil de tantas angústias e de permanente incredulidade, um certo desconforto vai assumindo corpo ao se cristalizar que a milícia ronda e paira sobre a cena nacional. Assistimos, perplexos, a um show de horror encenado pelo grupo que sustenta o presidente genocida.
O grande Machado de Assis nos ensinou que “a mentira é muitas vezes tão involuntária como a respiração”. Esse grupo mente tanto que não respeita a própria mentira. Abusa da sociedade brasileira e acredita na absoluta falta de indignação das pessoas. Joga com o desânimo, com o tempo que dedicamos ao combate ao vírus, com o descrédito das instituições e zomba com a inteligência das pessoas.
De certa maneira, estão sendo desnudados pelos fatos, que brotam de um enredo de quinta categoria, com a exposição rocambolesca de uma farsa que se abateu sobre a sociedade brasileira. A cada dia um escândalo como que a esconder, a sublimar o escândalo do dia anterior.
Já não se preocupam com a necessidade de ter uma linha de defesa. Acreditam mais na nossa falta de ânimo para enfrentar tantas barbáries. No nosso cansaço do enfrentamento do indizível, na impossibilidade de uma organização de resistência em meio ao isolamento e à pandemia. Já perderam a compostura e a necessidade de manter certo pudor ao afrontar a sociedade com uma postura de completo desrespeito à inteligência.
É como se tivessem lido Pessoa, na pessoa de Bernardo Soares, no Livro do Desassossego, e pensassem: “no baile de máscara que vivemos, basta-nos o agrado do traje, que no baile é tudo”. Só que eles certamente não leram Pessoa e apenas se cuidam de manter certas aparências, ainda que já desfigurados pela força inexorável das verdades que brotam dos escândalos diários. Em todas as áreas.
Viramos párias internacionais pela não política de enfrentamento do vírus. O mundo se queda perplexo com o completo desrespeito do governo brasileiro em relação a todas as orientações científicas no combate à pandemia. Difícil explicar que em plena crise o país continua sem um ministro da Saúde. Sem uma política de saúde. Sem um norte.
Para esse grupo que governa o país, o único objetivo é escapar da força do Poder Judiciário. É fugir da aplicação simples da lei penal pelos inúmeros crimes que estão vindo à tona. Afrontam o Judiciário ao tentarem emparedar, subjugar o Supremo Tribunal. A cada momento vai ficando comprovado que os ataques aos ministros do Supremo, às suas famílias e à instituição não eram fruto de um movimento espontâneo e sem estrutura. Ao contrário, é uma tentativa de um grupo inescrupuloso, de orientação fascista, financiado por empresários, e que ousa investir contra a estabilidade democrática.
Ao se voltarem contra o Supremo Tribunal e contra o Congresso Nacional, na realidade, queriam terçar forças para esticarem a corda da democracia. Por isto a importância de acompanharmos a investigação sobre quem matou Marielle. Se, ao que tudo indica, estas investigações se entrelaçarem e a milícia for a real sustentação de parte desse poder, a sociedade brasileira terá que se posicionar.
Tentaram fazer uma subleitura do artigo 142 da Constituição Federal para darem às Forças Armadas um protagonismo que a Constituição não lhes confere. Como se pudesse existir a hipótese de um golpe de Estado constitucional.
Ora, é reconfortante saber, com toda a certeza que a história nos dá, que jamais as Forças Armadas, em especial o Exército brasileiro, dariam guarida e respaldo ao citado grupo, em se comprovando a participação da milícia na sustentação do quadro político brasileiro. Não haverá sequer um soldado ou um jipe do Exército para afrontar o Supremo Tribunal.
Talvez tenhamos um miliciano armado às portas do tribunal, mas tendo que enfrentar os cidadãos amparados pela Constituição. E com amplo apoio da sociedade brasileira, como cantou o inesquecível Moraes Moreira no cordel QUARENTENA, publicado pouco antes de morrer:
“Até aceito a polícia
Moraes Moreira
Mas quando muda a letra
E se transforma em MILICIA
Odeio esta mutreta
Pra combater o que alarma
Só tenho mesmo uma arma
Que é a minha caneta…
Queremos sim ter as respostas
Sobre as nossas Marielles”