Por César Locatelli
A Grande Recessão de 2008 deixou uma lição inquestionável: os recursos canalizados para os bancos, ficam nos bancos. Empoçados. Claro que não se deve deixá-los sujeitos a corridas bancárias, mas que não se espere que partirá deles um alívio a quem precisa subsistir, e tampouco um alívio à economia.
Lembremos que, após a derrocada do Lehman Brothers, os bancos foram salvos, a General Motors foi salva, assim como a seguradora AIG e muitos mais. O povo que perdeu suas casas passou a ver democratas e republicanos como farinha do mesmo saco. E deu o troco elegendo um sujeito de “fora” da política. Bem verdade que o troco saiu pela culatra.
A Grande Depressão de 1929 deixou outra lição incontestável: austeridade, excesso de zelo com déficit, só faz aprofundar o desastre. Depois discutimos se devemos diminuir a dívida pública e sobre quem recairá esse encargo. Convivemos com inflação alta durante décadas e se voltarmos a ter que conviver com ela será um mal menor. Falar, nesse momento, de “perder anos de credibilidade monetária” é uma insânia.
A economia estancou e a única saída é colocar dinheiro nas mãos de quem não consegue suprimentos para sua subsistência mais básica. Aparentemente a cadeia de produção de alimentos continua quase intacta. As pessoas que perderam suas rendas ao terem dinheiro, consumirão. Elas não têm outra saída para sobreviver. Não há chances de entesourarem ou empoçarem a liquidez.
A discussão sobre como atingir os invisíveis, aqueles que ainda não estão em nenhum cadastro de assistência social precisa e pode ser feita. Mas, hoje, ou melhor, ontem, deposite-se dinheiro para os cerca de 12 milhões de cartões do Bolsa Família, que compõem as famílias de cerca de 50 milhões de pessoas. Dobre-se o valor. Pelo tempo que for preciso. E não se duvide que esses recursos atingirão muito mais gente. Solidariamente. Aí então discutimos como atingir quem ainda ficou fora. Aí discutimos a renda básica da cidadania.
Tanto faz se os recursos virão de emissão de títulos ou de emissão de moeda. Importante é a moeda nas mãos dos beneficiários que têm que se alimentar, em primeiro lugar. O papel moeda emitido entra, em grande parte, no sistema bancário e, após algum tempo, vira algum tipo de depósito, passível de pleitear juros e terá algum custo, mas certamente menor do que simplesmente substituir ativos financeiros dos bancos por moeda que não chegará às mãos de quem precisa. Também não está na hora de discutir o regime de metas de inflação e o sistema de zerar as reservas excedentes do bancos. Outros sistemas vigoram com sucesso em outros países. Passada a tormenta nos sentamos para discutir, tá bem?
Depois que falei tudo isso, em voz firme, para minha porta, ela esboçou a mesma reação que espero do comando da economia brasileira. Dureza!
* Artigo gentilmente cedido pelo autor e publicado originalmente na Carta Maior.