No último dia 25, a Folha de SP publicou entrevista do Juiz Desembargador João Pedro Gebran Neto, fato tido como surpreendente porque no histórico desse juiz, segundo a matéria, ele não costuma se pronunciar fora dos julgamentos e dos autos. Mas quem é esse juiz e por que, afinal de contas, ele assentiu em conceder a entrevista?
João Pedro Gebran Neto compõe a 8ª. Turma Criminal do Tribunal Regional Federal da 4ª. Região – TRF 4, da qual também participam os desembargadores Leandro Paulsen e Victor Luiz dos Santos Laus. Essa Turma aprecia e julga, em grau de recurso em segunda instância, os processos referentes à Operação Lava Jato e Gebran é o relator designado. A Revista Veja, em sua edição de 24 de janeiro de 2018, apontou-o como o mais duro e alinhado com o ex juiz Sérgio Moro.
A meu ver, após a decisão no Supremo Tribunal Federal – STF que anulou a condenação do ex presidente Lula no processo do triplex do Guarujá, o desembargador João Pedro Gebran sentiu-se compelido a se expressar publicamente, como tática de autodefesa. Explico-me.
No último dia 23 de março, em decisão histórica, pelo placar de 3 a 2, a Segunda Turma do STF deliberou pela suspeição do ex juiz Sérgio Moro no processo contra o ex presidente Lula no caso do triplex do Guarujá, acatando, portanto, os termos e as provas de irregularidades estarrecedoras cometidas pelo indigitado juiz, constantes do Habeas Corpus – HC impetrado pelos advogados do ex presidente em novembro de 2018.
Tal decisão teve como efeito anular todas as provas arroladas no processo do triplex e, consequentemente, a anulação da sentença condenatória proferida por Moro contra Lula, depois ratificada por Gebran et caterva no TRF 4. Nessa sessão da Segunda Turma do STF, além dos votos históricos e republicanos dos ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, o voto da Ministra Carmem Lúcia, pela suspeição de Moro foi decisivo, eis que ela reformulou o seu voto preliminar depois de se convencer, diante das evidências, de que Lula não teve um julgamento imparcial.
E quais medidas julgadas impróprias, e que configuram motivação política e parcialidade, conduziram à decisão no STF pela suspeição do ex juiz Sérgio Moro? Entre outras, estão as seguintes: 1) autorização para condução coercitiva espetaculosa do ex presidente Lula, sem que ele tivesse recebido previamente intimação para comparecimento voluntário; 2) autorização para interceptação telefônica de todos os advogados sediados no escritório que atua na defesa do ex presidente Lula; 3) autorização para interceptação de conversa telefônica entre o ex presidente Lula e a presidenta Dilma Roussef; 4) permissão para levantamento do sigilo da delação premiada do ex ministro Antônio Palocci às vésperas do primeiro turno das eleições presidenciais de 2018; 5) aceitação do convite para compor o ministério do candidato a presidente da república Jair Bolsonaro, decisão tomada antes da realização do segundo turno das eleições presidenciais de 2018; 6) atuação imprópria e decisiva nos bastidores, mesmo em pleno gozo de férias em Portugal, para anular a decisão do juiz desembargador Rogerio Favreto do TRF 4, que determinou que o ex presidente fosse colocado em liberdade.
Pois bem, todas as alegações sobre essas irregularidades estarrecedoras comprovadas, cometidas no âmbito da Operação Lava Jato e, portanto, da 13ª. Vara de Curitiba, sob a autoridade de Moro, e que constaram do HC julgado no STF, já haviam sido oferecidas, em sucessivos recursos, pelos advogados de Lula, em grau recursal de segunda instância, perante o TRF-4. E todas foram simplesmente ignoradas ou rechaçadas neste Tribunal, a começar pelo voto do próprio Gebran, relator do processo. Nunca é demais lembrar que a condenação do ex presidente Lula imposta pelo ex juiz Sérgio Moro não se lastreou em provas cabais, fato admitido pelo próprio juiz ao dizer que decidiu baseado nas suas convicções apenas.
O meu ponto é que os juízes desembargadores da 8ª. Turma Criminal do TRF 4 agiram em sintonia fina com a Operação Lava Jato, pois tinham conhecimento das deformações jurídicas acima mencionadas e, mesmo assim, não só as ignoraram ou as rechaçaram, a começar pelo voto do próprio Gebran, relator do processo, como também aceleraram convenientemente o trâmite processual, de modo a impedir a candidatura de Lula nas eleições presidenciais de 2018. Todo o enredo é o de uma trama golpista meticulosamente engendrada, que gerou o monstro que aí está, a destruir a Nação e a promover o maior genocídio da nossa história.
Com lapidar candura, ao ser questionado sobre a motivação política no âmbito do TRF 4, João Pedro Gebran afirmou que “…nunca houve nesse tribunal, nos juízes criminais, nenhuma intenção para que pudesse prejudicar ou beneficiar quem quer seja” e arrematou, sem corar, que “…nunca olhamos para a capa de processos, para nomes…não temos nenhum interesse político, o nosso procedimento é técnico-jurídico”. Como diria dona Maria das Dores, me engana que eu gosto!
Ao longo da entrevista, João Pedro Gebran se esforça para defender Moro e a Operação Lava Jato e considera a derrota de ambos o desfecho de uma guerra de narrativas, comparando-o ao ocorrido na Itália no âmbito da Operação Mãos Limpas. Para ele, a Operação Lava Jato despertou a esperança da sociedade brasileira no combate à corrupção, porém, no seu entender, essa mesma sociedade aquiesceu e se rendeu aos argumentos dos que, motivados por interesses próprios, atacaram essa Operação. Ao se posicionar assim, seu objetivo, por extensão, foi o de desqualificar a decisão do STF pela anulação das provas e da sentença condenatória contra Lula no caso do triplex do Guarujá, menosprezando os vigorosos argumentos que a sustentaram.
Sobre o conluio criminoso entre Moro e os procuradores da República de Curitiba na condução persecutória contra Lula, fartamente evidenciados pelos vazamentos proporcionados pela ação dos hackers, Gebran se limita a dizer cinicamente que tais mensagens “…são colocadas de modo absolutamente descontextualizadas, de modo equivocado, tentando induzir em raciocínios mentais para que as pessoas que leem as matérias, que trazem essas mensagens de um modo muito direcionado, muito equivocado”. E por que não menciona o massacre midiático contra Lula durante anos a fio? Ele não se destinou a induzir raciocínios mentais, doutor Gebran?
É bom que se diga que, apesar de ser uma questão juridicamente controvertida, as mensagens vazadas pelos hackers não foram consideradas provas lícitas no julgamento pela suspeição de Moro no STF. O que não se pode, contudo, é negar que elas são autênticas e contextualizadas, pois foram periciadas e sua autenticidade não foi questionada nem pelos procuradores nem por Moro.
As decisões do STF, tanto a do Ministro Edson Fachin, que admitiu não ser o foro da 13ª. Vara Criminal de Curitiba competente para apreciar e julgar Lula, quanto a da Segunda Turma, que decidiu pela suspeição de Moro, inegavelmente suscitam a suspeição do próprio TRF 4 e, particularmente, de Gebran, o mais proeminente lavajatista daquele tribunal.